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Mostrando postagens de dezembro, 2012

Esquecimento.

Ela não tem direito de afirmar o que está dizendo nesse momento, sim, ela diz, eu tenho. Não tem. Você não tem direito. Não chegue mais perto; não se aproxime. Eu sou casada com você. Não é. Você foi embora. Largue minha mão. Enfermeira, por favor, tire essa mulher daqui. Eu te amo. Não ama. Vou embora. Vá embora.              As pessoas não deveriam fazer promessas que elas não fossem cumprir. As emoções tomam contam do que somos; o ar que nos respiramos é mais intenso, nos corroemos por dentro. Prometemos o mar, o céu e toda a beleza do mundo. Mentimos sobre nossas incapacidades e defeitos. Inventamos desculpas, refazemos personalidades e afirmamos perfeição. Absurdo. O homem deitado na maca do hospital não lembrava mais do seu nome, mas ele tinha certeza que ela havia quebrado uma promessa. Não conseguia mais se lembrar da promessa, mas conseguia, com certeza, relembrar que ela a havia quebrado. Ele lembrava principalmente da sensação: o problema não era ser enganado. A vi

O diário secreto de Dr. Henry Jekyll.

Eu não sou uma pessoa. Eu não estou aqui. Eu não deveria estar aqui. Você pode me ver, mas eu estou vazio. Essa era a primeira descrição dada ao Minotauro; preso no mesmo labirinto sua vida toda. O médico sentado na mesa pensava como tal momento descrevia a si mesmo. Os olhos cansados, o labirinto eterno dos mesmos problemas, a fraqueza. A fórmula deveria ter salvado sua vida. Nenhum médico conseguia diagnosticar sua doença. Os sintomas eram claros: insônia, fraqueza e desespero existencial. Ele vinha passado anos em silêncio como forma de se submeter ao mundo. Havia se deixado calar milhões de vezes frente a humilhações. Pegou a faca na estante, várias vezes, pensando em qual seria a sensação quando ele morresse. Não teve coragem. Não era forte o suficiente. Ele se sentia desapegado demais de tudo que o cercava. Não tinha amigos. Ninguém próximo com quem dividir sua vida. Foi abandonado por tudo que tinha. Lembra da sensação de atravessar corredores vazios lotados de pessoas sem ros

Um ataque ao romantismo.

Dois pressupostos do romantismo: o sentimento é mais simbólico do que físico; sofrer é algo inerentemente bom. Atacar o problema precisa de um começo bem simples. O físico determina boa parte da nossa vida, mesmo que não possamos de forma categoria afirmar que ele realmente existe. Outro argumento importante seria que o físico só existe, na medida, que nós o pensamos simbolicamente. Por exemplo, se eu corto seu pulso com uma faca, você pensara tal ato simbolicamente. Você não terá certeza nem que isso realmente aconteceu segundo o cético. Suas sensações não são garantias de nada. Caso sejam, somente as suas teriam qualquer significado no simbólico.              Ignorarei tal discussão, pelo simples fato que o consenso social determina o contato físico como o fundamento de todo e qualquer tipo de relacionamento. Quero acusar o principio simbólico do romantismo; não existe razão em eliminar o físico em oposição a uma metafísica. Independentemente da quão bonita tal metafísica seja.

Plano de contenção.

Plano de contenção. Era o que ela falava para si mesmo enquanto mudava seu apartamento de lugar. Mudar os livros do lugar iria organizar sua mente. Ela planejava, de novo, outro momento da sua vida. Teria sido aquele seu erro inicial? Casamento jovem. Fracasso de ter filhos. Fracasso do casamento. Traição. Trabalho com alta recompensa financeira, porém nenhum prazer. Se ela não tivesse planejado tudo até o último momento, será que ela não seria mais feliz? Ela se perguntava enquanto fazia um plano de contenção. Algo tão genial que organizasse toda sua vida em um suspiro. Começou a recitar formulas de repensar sua vida: 1. Preciso sorrir com alguém. 2. Um trabalho em que eu seja feliz pelo menos de vez em quando. 3. Menos planos de contenção. Refez suas idéias; começou a recitar seu plano de contenção no dia em que seu marido avisou que havia lhe traído com outra mulher. Naquela noite, a garagem estava aberta e os dois estavam fazendo sexo no carro. A amante e seu ma

Extremamente bobo, incrivelmente patético.

Patético. Era essa a palavra que qualquer um usaria para definir aquele pequeno velho sentado na praça da cidade. O olhar triste de quem não fazia nada o dia inteiro. Mal sabiam que ele já tentou ser um ser humano ativo; alguém vivo. Infelizmente, sua mente havia sido quebrada há muito tempo atrás. Sentava no banco da praça para observar uma mulher vinte anos mais nova passando na sua frente. Lógico que ele era patético. Estava na sua expressão. Uma marca definida pela sociedade sobre quem ele era. Sua falta de capacidade de mudar qualquer coisa ao seu redor. A vontade de ficar a vida inteira no mesmo lugar sem nunca se mover.              No começo do cristianismo, a confissão era uma marca carregada como reconhecimento do pecado. A falta de comida e de privilégios era dada ao padre que optava por reter aquela marca. Respeito dos outros era o que eles buscavam ao passar por todo tipo de tortura corporal e mental. O velho naquele banco pensou que ele tinha exatamente um tipo de m