Lavatory, Lovestory.

Guadalupe acordava toda dia para seu trabalho, que consistia em cobrar dinheiro para entrar no banheiro do metrô. Ela tinha longos olhos negros, pele morena clara e cabelo não liso e não Bombril, um meio-termo. Tinha um pequeno excesso de peso, talvez 10 ou 20 kg a mais do que a taxa normal. Usava todos os dias um vestido de cor diferente do anterior, naquele ambiente cinzento um pouco de cor era o que fazia as coisas agüentáveis. Sonhava acordado o dia inteiro, olhava para grandes revistas de moda e esperava que um dia fosse ela nas revistas. Ela ansiava por ser a mulher abraçada, por ter nas suas costas um homem que a amasse.

Segunda feira cinzenta, tudo parecia preto e branco, ela continuava lendo suas revistas esperando uma solução para seus problemas. Dezenas de homens passavam sem percebê-la por trás das revistas e jornais, somente deixavam o dinheiro para poderem usar o banheiro. Seu vestido era longo, amarelo e com pequenas flores. A vida era triste e parada, talvez milhões vissem o mundo como ela: sofrido, repartido, sonhado, quebrado e triste. Flores amarelas surgiram de repente no pote de dinheiro. Sua cabine cheia de fotos de casais famosos e a parte mais limpa de tudo se iluminaram. Havia vida.

A expressão correta seria clichê, algo como a luz no final do túnel, a verdade é que cor iluminava um lugar cinza. Guadalupe espantada correu atrás das pequenas flores amarelas no chão, um caminho claro se formava até o banheiro dos homens. Ela vasculhou todas as portas, e tudo estava vazio. Na última porta onde o rastro acabava se encontrava 10 rosas da cor mais amarela. Quando ela voltou, as rosas amarelas continuavam perto da sua cadeira de cobrança. Ela gentilmente pegou um vaso de flores, e colocou em destaque na sua lateral esperando que o admirador se apresentasse.

Os dias passaram, e nada acontecia. Ela cada dia mais achava que homens românticos só existiam no cinema. Ela continuava admirando-se com as histórias de cinema, e as revistas. Aquilo era o que a mantinha sã nas piores horas do dia. As rosas acabaram por não durar e seu dia voltava a ser um filme preto-e-branco.

Era uma sexta, e ela acordou. O seu pote de moedas estava cheio de rosas vermelhas. Rosas lindas compradas de uma bela floricultura, envoltas no mais belo laço dourado. Ela de novo por frações de momento sentiu um pouco de felicidade. As cores são esquecidas, o mundo se imobiliza por instantes e ganha cor. O segundo iluminado é como uma sexta-feira apaixonado. Os olhos de Guadalupe tinham uma cara própria e ela parecia assobiar uma música antiga, talvez algo do Sinatra. Ela começou a dançar enquanto ensaboava os banheiros. Ela colou dois panos nos pés e começou a dançar. Ela viu de novo os rastros das flores indo para a última cabine, e mais uma vez, nada se encontrava ali.

Seus dias passaram rapidamente, o dia sempre passa por você, mesmo você não estando preparado. Ela continuava ali cobrando o mesmo dinheiro, observando o mesmo jornal, desejando o mesmo final de filme. “Nós sempre teremos Paris”, era mais ou menos o que ela queria.

Os homens que passavam todo dia pela sua cabine eram executivos, altos, organizados, o verdadeiro orgulho da sociedade, seja lá o que isso queira dizer. Ela correu, era o último turno do dia. Um homem baixo, estorricado, e sorridente se encontrava sentado. Novas flores estavam no pote. Hoje a última cabine tinha alguém.

Ela tinha um homem esperando por uma mulher esperando seu final de dia. Seu nome era Gregório, nome de poeta famoso. Era baixo, não altivo, simples, sorridente. Seu terno era simples, amassado e amarrotado. O sorriso dele era constante, e parecia pouco de cada vez iluminar partes do lugar. Gregório segurava uma única rosa branca, ela segurava várias rosas de nenhuma cor. Eles se beijaram, na última cabine, e por um segundo havia cor.

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